Poesias





SONETO  DE ALVARES DE AZEVEDO
Poeta da Segunda Geração Romântica

Pálida, à luz da lâmpada sombria,
 Sobre o leito de flores reclinada, 
Como a lua por noite embalsamada,
 Entre as nuvens do amor ela dormia!

 Era a virgem do mar! Na escuma fria
 Pela maré das águas embalada! 
Era um anjo entre nuvens d´alvorada
 Que em sonhos se banhava e se esquecia!

 Era mais bela! O seio palpitando...
 Negros olhos as pálpebras abrindo...
 Formas nuas no leito resvalando... 

Não te rias de mim, meu anjo lindo!
 Por ti - as noites eu velei chorando,
 Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!









"Dois e Dois são Quatro"

Como dois e dois são quatro
Sei que a vida vale a pena
Embora o pão seja caro
E a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
E a tua pele, morena
como é azul o oceano
E a lagoa, serena

Como um tempo de alegria
Por trás do terror me acena
E a noite carrega o dia
No seu colo de açucena

- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena.
Ferreira Gullar


TRADUZIR-SE


Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.


uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.


Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.


Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.


Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.


Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?"
Ferreira Gullar




UM CONTADOR DE CAUSOS

 
Nas longas noites de inverno
Lá pelos lados do sertão
Alguém contava seus causos
Esfregando suas mãos
Num fogão à lenha aquecido
Todos ouviam com atenção

Com sua calma já conhecida
Seu fumo de corda, enrolava
“Como se tragasse a vida”
Uma  bela tragada dava
No silêncio da noite fria
 Suas histórias contava

Com seu jeito simplório de falar
Ele começava a narração:
“_ Pois é...vocês pode num acreditá
Inté dizê que é minha invenção
Juro que o causo que vô contá
É verdadeiro e pra ficá no coração

Algum tempo atrás
Eu tava andando no sertão
Lá pelas bandas do rio Novaes
Co’a minha cartucheira na mão
De supetão, vi em riba de mim
Alguma coisa fazendo um baita baruião


Era um tar de macaco carvoeiro
Me  mostrando seu filhote na mão
Mirei no arvo minha cartucheira
E o desgramado a chorá pedia que não
Num quis  sabê, sapequei fogo ligeiro
Derrubei o macaco no chão

Seu fio saiu no mato correndo
Berrando, sem quarqué direção
Inda tentei atirá outra vez
Mas minha espingarda caiu da mão
Escutei uma voz do céu dizendo
Pra que tanta mardade e judiação?

Fiquei três dia perdido na mata
Sem direção,  iguar louco andando
Co’a minha cabeça delirando
As veia parecia que tava sartando
Mais no memo lugar  sempre vortando
Enxergando todo tipo de assmobração

Era  boitatá que no arto alumiava
Uma mula-sem-cabeça que corria
Um saci pererê que ria e pulava
Um lobisome  uivando se ovia
Quando  um tar vampiro  se deitava
Fiquei sabendo que amanhecia o dia



Quase morrendo de medo,
Pro  Senhor Deus  pedi perdão
Jurando inté c’os pé junto
Não pecar nunca mais não
Não  matá quarqué animá
Nem fazê quarqué judiação

Meu pedido  Ele logo atendeu
E por uma  invizíve mão
Fugi daquele inferno
Agradecendo a solicitação
Nem pude acreditá
Que escapei daquela aflição!

O causo de hoje terminô
Nem  labareda  tem pra esquentá a mão
Intão , mio tudo nóis i dormi
Prá amanhã cedinho cuidá da prantação
Tomara Deus que sonhemo c’os  anjos
Pra ninguém sonhá co’assombração.”

Na lembrança guardo e até sonho
Com aquelas noites frias de inverno
Quando Messias Rodrigues Pereira
Com seu olhar singelo, doce, terno
Seus causos contando, me observava
Num gesto saudoso e paterno.


Messias Rodrigues Pereira





Barbaridade... Adorei

Onde se viu tamanha barbaridade
 Não é que aconteceu de verdade
Se contar ninguém acredita
Os alunos ficaram bem na fita
Escreveram poemas de cordel
Com histórias reais e de papel

Depois de muita transpiração
Suar faz bem até ao coração
Pensar, escrever, apagar
Suas historias conseguiram contar
Algumas engraçadas outras bonitas
Por todo o povo serão vistas

Os alunos do oitavo A
Demoraram  a conseguir  engrenar
Mas depois que  a escrever começaram
Gosto pela coisa tomaram
 De idéias , a cabeça cheia
Viajam, a imaginação passeia

Oitavo B mais numeroso
Mais falante e preguiçoso
Foram os primeiros a entregar
Também com bacanas histórias
Dessas de ficar na memória
 Que para sempre vamos lembrar

No oitavo C acontece um milagre
Escrevem com sinceridade
Fatos populares da nossa  cidade
Que emocionam por sua lealdade
Pois onde existe sincera amizade
Nunca vencerá a maldade


Os alunos do oitavo D
Me convenceram pra valer
Com histórias de rock e cinema
Nem faltou a fazenda Ipanema
Causou me grande emoção
E abalou geral o coração

De todos estou muito orgulhosa
Pela boa impressão que causou
A história  fabulosa
Que cada aluno contou
São verdadeiras preciosidades
Mais profundas que a realidade

Nunca  esquecerei o trabalho
Realizado com amor e carinho
Vocês podem não acreditar
Mas a  verdade é o caminho
Muitos anos podem se passar
Na lembrança , vou guardar direitinho

Peço então a Jesus
Filho de Deus, nosso irmão Salvador
Que  nos de sempre sua luz
Sua verdadeira paz e seu amor
E sua  boa nova que ao céu conduz
 Que eu leve  por onde eu for.


Divertido, interessante e valoriza a literatura popular.

De Manoel Caboclo
"O homem que de à luz um menino"
O poeta é um repórter
De pensamento ligado
Ouvindo o que o povo diz
Fazendo tudo apanhado
E sai contando na rua
Tudo quanto é passado

Se viu na televisão
Contando  toda verdade
Que um cientista disse
Que há possibilidade
De um homem ter um filho
Havendo oportunidade

Agora chegou o tempo
Das coisas tudo mudar
O homem fica em casa
E a mulher vai trabalhar
Não querendo mais ter filhos
Mandando a trompa ligar

Com esse aperto de vida
Aumenta o peso da cruz
A fome avança no lar
O dinheiro se reduz
Apareceu este meio
Para o homem dar a luz

Começou por Zé Totonho
Maria da Conceição
A mulher disse para ele:
_ Vou fazer a ligação
Eu não quero mais ter filhos.
Totonho disse: isto não

Ele disse Mariquinha
Isto você não arranja
Porque deixa a mulher fria
Igual a um pinto de granja
A mulher disse eu vou
Nem que o diabo "franja"

A mulher do meu vizinho
Tem quase setenta anos
Fez agora ligação
Para não perder os planos
E eu vou fazer também
Pra não haver desenganos

Seguiu dali ao médico
E fez logo a ligação
Para nunca mais ter filhos
Totonho disse então:
_Saiba que eu vou embora.
E arrumou o matulão

Daquele dia por diante
Totonho se ausentou
E não dormiu mais em casa
Num cabaré se arranchou
Quando menos esperava
Totonho engravidou

Nisto ele conheceu
Que a mulher tinha razão
Vendo o bucho crescer
Totonho passava a mão
O menino dava pulos
Parecia um tubarão

Segurado numa corda
Totonho em agonia
Se contorcendo de dores
O menino estremecia
E a negrada dizendo:
Zé Totonho vai dar cria?

Chamaram dona Maria
Para pegar a criança
A parteira experiente
Disse logo sem tardança
Pra este menino nascer
Precisa cortar a pança

Mandaram chamar o médico
Que era a única esperança
Quando o médico chegou
De Totonho cortou a pança
No dia 4 de agosto
Nasce a dita criança

Deu-se um grande rebuliço
Quando o menino nasceu
Às doze horas da noite
Um terremoto se deu
Pro lodo do estrangeiro
Que muita gente morreu

Os galos se espantaram
Numa zoada tremenda
Os cachorros alarmaram
Numa enorme contenda
Todo povo admirado
De ver aquela legenda

Nisto o menino falou
Para o povo que assistia
Dizendo meu pai agora
Me leve à água da pia
Porque este mundo velho
Está chegando o último dia

Desde o ano de oitenta
Quando começou o jogo
As coisas mudaram muito
O mundo vai pegar fogo
Já foi marcado por Deus
Não adianta mais rogo

Logo o menino calou-se
O pai ficou conformado
Dizendo isto acontece
A quem está desempregado
Mas minha mulher trabalha
Vai criá-lo com cuidado

Mariquinha disse: Totonho
A preguiça é um horror
Quando se perde o emprego
Procura outro qualquer for
Pois nunca falta serviço
Pro homem trabalhador

Totonho lhe respondeu:
O trabalho é muito ruim
Abandonei a enxada
Pode ela levar fim
Quando eu puxava por ela
Ela puxava por mim

É melhor se ter um filho
E durante seu resguardo
Beber caldo de urubu
Comer cururu torrado
Ou ser um guia de cego
De que ir para o roçado

A mulher disse Totonho
Esse ato é muito baixo
Eu não sou bananeira
Pra criar filho de macho
Vou chamar Zé capador
Para derribar-lhe o caixo



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